sábado, julho 31, 2004

A Vitória Grega - Olimpíadas 2004

A Vitória Grega
Resumo: um comentário sobre as olimpíadas de Atenas - o significado da simbologia da cerimônia de abertura e as implicações políticas e culturais previstas do evento.
Quando os gregos criaram os jogos olímpicos com toda certeza nem desconfiavam dos desdobramentos que este evento teria vários séculos depois.

A Olímpiada de Moscou em 1980 foi um marco na história dos jogos olímpicos modernos, na medida em que a cerimônia de abertura representava a efervecência que antecipava os acontecimentos do final da década: a abertura da então União Soviética para o mundo, o advento da mundialização e as radicais transformações na cultura e nos costumes que viriam a partir de então.

Os espanhóis e os coreanos tiveram um êxito muito grande no que diz respeito à grandiosidade exigida e na interrelação sócio-econômica e histórica que decorreu do evento: o surgimento da União Européia e o ápice dos tigres Asiáticos.

Como foi amplamente comentado na imprensa, os gregos estão apostando tudo nesta olimpíada no sentido de provocar a “decolagem” da Grécia no cenário internacional, em especial no que diz respeito ao seu já tão forte turismo.

Há questões que se referem a momentos culturais da humanidade, como foi por exemplo, o Iluminismo em relação à Revolução Francesa; mas este movimento cultural deu-se de forma ligada a uma determinada época.

A filosofia e a cultura helênica vai muito além disso, aliás, muito além das fronteiras da própria Grécia – Alexandre, O Grande que o diga – trata-se da configuração mais completa dos fundamentos da civilização ocidental.

E os gregos exploraram isto de forma magistral na cerimônia de abertura das olimpíadas.
O Centauro – meio homem, meio cavalo – símbolo mitológico do lado animal que existe dentro de cada um de nós e que precisa ser domado, este eterno conflito entre razão e instinto – bem foi colocado na cerimônia como elemento primordial que fecundou a criatividade humana – o conflito – como bem diria Heráclito, “da tensão entre a corda e o arco na cítara nasce a mais bela harmonia” – a harmonia dos contrários.

Tanto assim foi que Eros esteve presente do começo ao fim da bela cerimônia que bem poderia ser interpretada segundo um instrumental de Nietzsche – a razão de Apolo em contraposição à embriaguês de Dionísio.

A tragédia grega – o despedaçar do bode que ocorria no final das cerimônias bacantes nas quais a embriaguês e a libertinagem garantiam o caos gerador – também esteve presente de forma bem direta – o esfacelar da cabeça, representando os vários momentos do desdobramento da cultura grega no ocidente – de memorável representação da pedra cúbica pitagórica, presente de forma intensa até os dias de hoje no simbolismo esotérico – por exemplo, o trono do Imperador, arcano IIII do tarô – a pedra fundamental da criação, centelha divina dentro de cada homem – a racionalidade construtora da cultura, seu alicerce mais fundamental.

Espetacular desfile da “clepsidra” na qual toda a história helênica e ocidental foi contada de forma direta e completa, a partir da civilização minóica até a civilização contemporânea. Édipo, espetacular, Héracles (Hércules) em combate com a Hidra, a guerra de Tróia e por aí vai.

Nada mais mediterrâneo que a oliveira, presente de Palas-Atena, a deusa da sabedoria, para os homens. Alimento indispensável ao homem mediterrâneo com seu azeite de múltiplo uso, uma árvore resistente que adapta-se aos mais variados tipos de terreno – assim como se idealizava a Hélade (grécia) de Péricles, o Pai da Democracia, contemporâneo de Sócrates, Platão, Aristóteles e outros grandes mestres da cultura helenista, mãe de toda cultura ocidental.

E percebam – do começo ao fim, Eros, o impulso fecundador, sempre presente... aliás, a cerimônia em seu momento mais humano – pós-Centauro – foi iniciada pelo casal de amantes – sede fecundos! E gerai uma civilização! E aqui estamos nós!

Mudando um pouco o foco dos comentários, exponho a má impressão sobre o mau gosto da roupa da delegação brasileira na abertura – um verde-abacate-cítrico cheirando a New Wave dos anos 80 (dá-lhe B 52), com uma ridícula textura-estampa nas gravatas e saias que, se não fossem os comentaristas da Globo, eu jamais ligaria com a textura das calçadas de Ipanema – mais uma vez o Rio de Janeiro apresenta-se em nome do Brasil, ignorando todo nosso ecletismo e grandesa cultural.

Longe de mim querer alimentar a tola rivalidade entre paulistanos e cariocas, já que enquanto bandeirante sou suspeito em relação a quem adora papar goiaba, a velha hegemonia ditatorial presente em nossas entidades esportivas só pode ter como resultado absurdos como esta ridícula escolha do projeto de Mônica Conceição para os trajes de abertura – isso sem comentar a candidatura sem base alguma do Rio de Janeiro para as Olimpíadas. Mas isto é outra história.
Parabéns para as delegações africanas que apresentaram belíssimos e imponentes trajes, como por exemplo, a Etiópia, a Libéria, Mali, Niger, Nigéria e Benin, mostrando que não só a miséria é algo que a eles deva ser relacionado. A Malásia (Ásia) também fez memorável desfile de abertura.

Já Barbados, Brasil e Botsuana... deixaram muito a desejar neste sentido.

Parabéns para Gianna Angeloupolos, presidente do comitê organizador, pela presença carismática, confiante a acolhedora que passou ao mundo no discurso de boas vindas e abertura das Olimpíadas.

Bancaremos os próximos Pan-Americanos – onde? – Rio de Janeiro, ótimo, vejamos no que vai dar. E assim, bancando eventos e espetáculos esportivos do gênero, quem sabe os países emergentes poderão encontrar um caminho na fascinante teia de comunicação internacional para mandar o seu recado: podemos trabalhar, podemos vencer! E que bela vitória grega!
Douglas Gregorio::